sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Vilões a la Shakespeare




Com o post Shakespeare na Tv, por causa de sua repercussão.... voltamos a falar dos vilões da tv brasileira que são inspirados em personagens de Shakespeare. No site o Mundo é um palco , há um texto super bacana relacionado a este fato. Espero que gostem!!

Durante a última semana do ano de 2008, no país das telenovelas, os vilões monopolizaram a atenção do público. Ao ler em revistas, jornais ou na Internet notícias relacionadas às novelas, vemos que a ação em torno da grande vilã da novela das oito foi um dos fatores motivadores da elevação de audiência. Isso me fez lembrar do fenômeno Odete Roitman.

Às vezes me detenho na questão do porquê desses vilões e suas cenas exercerem esse fascínio no público. Talvez essa atração se dê por ser a dor o início da memória, de acordo com Nietzsche e Montaigne e por esta habitar o entorno dos vilões: sempre produzem a dor alheia, sendo muitas vezes, eles mesmos frutos de suas dores intestinas.

Assim, um bom vilão - ops! - quero dizer, um personagem mau-caráter bem desenvolvido, parece ser a fórmula garantida para conquistar o interesse popular. Atenção roteiristas de plantão que adoram fórmulas prontas!

Mas, só quem já tentou, sabe como é difícil desenvolver esse tipo de personagem, sem cair na armadilha do maniqueísmo piegas que vitima 99% dos roteiros de televisão e cinema nacionais. E tem mais: depois de desenvolvê-lo, ainda precisa ter a sorte de encontrar o ator ou atriz com preparo e maturidade para entender e externar a profundidade de tais personagens - o que parece ter sido o caso da espetacular Patrícia Pillar.

Comecei a escrever este post motivado pela ligação telefônica de uma aluna que, entusiasmada do outro lado do fone, sugeria que eu desse um jeito assistir ao capítulo da novela A Favorita no qual a personagem Flora (Patrícia Pillar) arquiteta a morte de Gonçalo (Mauro Mendonça) levando-o a um colapso cardíaco através de indícios do assassinato (que não ocorrera) de sua neta. Embora a cena tenha derrubado o Ibope, gerando protestos por uma parte do público indignado com a crueldade da personagem, do outro lado da linha, ela estava empolgada com o "clima" shakespeareano da cena que remetia-lhe à sangüinária peça Titus Andrônicos a qual havíamos abordado no semestre passado. Até o momento não tive oportunidade de ver o mencionado capítulo, porém, confesso que fiquei curioso para saber como as cenas narradas por ela foram resolvidas e a levaram a sentir o "clima" de uma tragédia de Shakespeare. Se alguém souber onde posso encontrar a cena, por favor, me informe.

Na verdade, na façanha do oxímoro do "bom-vilão" o clima shakespeareano é quase inevitável. Os melhores autores bebem direto em fontes cristalinas. Machado de Assis, nosso maior autor saiu na frente ao levar Bentinho para assistir a Otelo. Para conhecer os melhores vilões de todos os tempos, vá direto à fonte. (Que sonho, se este comentário levasse o público das novelas até as obras de Shakespeare! Oxalá isso ocorra com Som e Fúria, especial que Fernado Meirelles dirige em 2009 na Globo sobre uma trupe de atores shakespeareanos).

William Shakespeare oferece uma gama de vilões que vai de um extremo a outro do espectro de sentimentos definido pela condição humana animalizada - do frívolo racional ao sangüíneo irracional, ou como prefere Harold Bloom, na galeria dos vilões de Shakespeare, podemos encontrar as categorias dos vilões assassinos e dos vilões cômicos. Fazem parte da primeira categoria Aarão o Mouro da peça Titus Andrônicos, Iago de Otelo, Edmundo de Rei Lear e Ricardo III e Macbeth das peças com o mesmo nome dos personagens centrais. Os vilões cômicos são personagens como Shylock de O Mercador de Veneza, Caliban de A Tempestade e Malvólio de Noite de Reis.

A maestria com que Shakespeare constrói estes personagens, raramente foi igualada no passado ou no presente. São vilões que revelados, permanecem impressos em nossas memórias com a mesma clareza que a intensidade intelectual de Hamlet e o desprendimento de Falstaff - personagens capitais, tradutores da própria condição humana - seja ela o que for.


Escrito por Ronaldo Marinsky

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